Muito se fala em desenvolver a criticidade e a autonomia de pensamento em nossas crianças. Parece uma tarefa tão difícil, inalcançável, pois não é!

Aprecio muito as crônicas de Rubem Alves. Tive o prazer de dar um abraço bem forte nele, em uma Bienal do Livro em SP. Abraço que se guarda no coração, naquele lugar bem quentinho, que não se esquece!

Preciso falar dele: ele nos ensinou que precisamos ter coceiras nas ideias, assim como as crianças. A curiosidade nos causa coceiras nas ideias. As crianças vivem com curiosidade, logo, possuem coceira nas ideias. E nós, adultos, vamos, com os anos, deixando de ter curiosidade, deixando de procurar algo novo, nos acostumamos com a mesmice. As crianças não. Perguntam, mexem, inventam, criam, vivem investigando. E nós, adultos, muitas vezes, teimamos em passar uma “pomada” para acabar com essa coceira, não permitindo que a curiosidade se transforme em novo aprendizado!

Estar atento às perguntas das crianças, as curiosidades, as investigações, permite que o aprendizado ocorra, que as sinapses aconteçam, que as comparações gerem novos conhecimentos.

Quando uma criança vier com uma pergunta, não entregue a resposta de “bate e pronto”! Devolva com outra pergunta, em cima da que ela lhe fez. Faça um movimento circular, de tal forma que a criança pense, criticamente, sobre a pergunta inicial e, assim, vá construindo seu conhecimento. Vejamos um exemplo, que me fez lembrar muito de uma das crônicas de Rubem Alves e, que tive a felicidade de presenciar em casa: “Pai, o que é isso?” – pergunta Beatriz ao descobrir a trena nas ferramentas do pai. “Uma trena” – o pai respondeu. Intervi e questionei: “Você sabe para que serve uma trena, Bia?” – ela me olhou, com aqueles olhos de “ué, não sei!” Peguei a trena, abri e, ao visualizar os números, postos em ordem, ela imediatamente respondeu: “Pra saber o tamanho, igual àquela sua fita!” (remetendo-se a fita métrica). A comparação com algo que ela já conhecia, por vivenciar a aprendizagem em outro momento, trouxe um novo aprendizado. Passado uns dias, na casa da avó, Bia vê a vó mexendo com uma fita métrica e diz “Igual da minha mãe, mas a cor é diferente! O que você vai ver o tamanho?”

Precisamos nos atentar a permitir que a criança construa seu saber, sem tolher seu pensamento. Precisamos permitir uma “coceira constante nas ideias”, permitir que ela reaja aos questionamentos de maneira a construir um novo saber, permitir que ela questione, faça inferências e, estarmos prontos para mediar o aprendizado devolvendo as perguntas de maneira reflexiva, possibilitando novas perguntas, numa dialética constante.

Já dizia René Descartes (1637) “Penso, logo existo”. Vamos nos permitir existir, não apenas sobreviver!

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